DEFORMIDADES CRÂNIO FACIAIS – IMPORTÂNCIA DA ORIENTAÇÃO MATERNA NO PÓS-PARTO.
*Evelise Aline SOARES, **Mylla Marcella ROCHA, **Maria dos Santos MACHADO, **Thiago Donizeth da SILVA.
RESUMO
Deformidades crânio-faciais
(DCF) são anomalias congênitas gerando no seu portador alterações
anatômicas, funcionais, estéticas e psicológicas. A espera
do bebê trás ansiedades as mães e ao deparar com uma DCF
surgem medos e inseguranças no cuidar, alimentar e tratar de seu filho.
A orientação ainda em ambiente hospitalar garante a qualidade
de vida do bebê e a tranqüilidade da mãe até os tratamentos
específicos. O presente estudo teve como objetivo verificar as orientações
recebidas nos hospitais por mães de bebês com DCF e as dificuldades
encontradas pelas mesmas nos cuidados com o bebê. Foram entrevistadas
100 mães de portadores de DCF, que nasceram em cidades sul-mineiras e
atualmente são atendidos no Centro Pró-Sorriso – Alfenas
MG. Nas entrevistas foram levantados dados referentes às orientações
transmitidas pela equipe hospitalar, as dificuldades nos cuidados e alimentação
do bebê. Grandes partes das mães saíram do hospital sem
orientações referentes aos cuidados com o bebê, sentindo-se
inseguras para amamentar e cuidar dos mesmos. A equipe médica e para-medica
não foi efetiva na assistência a mãe e ao bebê com
DCF.
Palavras chave Fissuras labiais, fissuras palatais e malformações.
* Mestre em Anatomia Humana pela
Unicamp e Docente da faculdade de Enfermagem da Unifenas.
** Acadêmicos da Faculdade de Enfermagem da Unifenas.
1 - INTRODUÇÃO
Uma fissura é um espaço anormal congênito no lábio,
alvéolo ou palato. O termo coloquial é lábio leporino ou
goela de lobo. Os termos apropriados são fissura labial, palatina ou
lábio-palatal (PETERSON et al., 1996). As fissuras lábio palatais
são malformações crânio-faciais e enquadradas na
classificação das displasias (CAMPIOTTO et al., 1997).
As fissuras faciais e palatais são relativamente comuns que ocorrem na
freqüência de um para cada 800 a 1000 nascimentos (SONIS, FAZIO e
FANG, 1996).
De acordo com a teoria clássica, as fissuras do lábio e do palato
são deformidades do desenvolvimento que ocorrem quando um ou mais dos
processos embriogênicos da face não se fundem com os processos
adjacentes. Assim, as fissuras do lábio são resultantes da falha
de fusão entre os processos frontonasal e maxilar, por volta da sexta
semana do desenvolvimento embriológico. Fissuras do palato resultam da
falta de fusão das placas palatinas do processo maxilar, que ocorrem
por volta da nona semana do desenvolvimento (TABITH, 1989).
As fissuras de lábio e/ou palato consistem em anomalias que acarretam
uma série de seqüelas que podem acompanhar o portador pôr
toda a vida (LOFIEGO, 1992). Estas anomalias faciais congênitas conduzem
a uma série de implicações funcionais estéticas
e psicossociais do seu portador (KUDO et al., 1997).
A equipe interdisciplinar para o atendimento do indivíduo fissurado é
composta de cirurgião plástico, geneticista, pediatra, otorrinolaringologista,
ortodontista e ortopedista funcional dos maxilares, nutricionista, enfermeiros,
fonoaudiólogos, psicólogos, serviço social e outros (CAMPIOTTO
et al, 1997).
A criança, ser em fase de desenvolvimento e formação física
e mental, necessita de constante suporte nutritivo, emocional e intelectual.
O apoio psicológico, embasador em proteção, estimulação,
compreensão e carinho é fundamental para que alcance o equilíbrio
evolutivo orgânico e cerebral. Pessoas que nascem com deformidades que
interfiram em sua capacidade natural de serem adequadamente alimentadas e que
alterem a auto-estima têm , a principio, handicap negativo em suas possibilidades
de evolução normal. Neste caso enquadram-se os indivíduos
nascidos com fissuras lábio-palatinas (ALTMANN, 1997).
Segundo Araruna e Venrúscolo (2000), muitos são os aspectos envolvidos
no cuidado da alimentação da criança fissurada, envolvendo
relações complexas de caráter afetivo, social, econômico
e cultural, que influenciam na relação mãe-filho, na discriminação
social da criança, na dificuldade da mãe cuidar e alimentá-la.
A ansiedade devida a malformação bucal do bebê desencoraja
a mãe para amamentar o bebê ao seio, pôr isto se deve fazer
um trabalho junto à mesma com o objetivo de fazê-la entender que
esta sua reação só trará prejuízo ao seu
bebê e que a amamentação é indispensável para
a sobrevivência do mesmo (LOFIEGO,1992).
Já que a intervenção nas deformidades crânio-faciais
não podem ser preventivas, pois, trata-se de um anomalia congênita,
a equipe constituída por vários profissionais deverá visar
o controle: (a) das altas percentagens de óbitos; (b) da desnutrição
provocada pela falta de orientação da mãe; (c) da inibição
do crescimento do complexo nasomaxilar; (d) do aparecimento de deformidades
oclusão; (e) das seqüelas auditivas; (f) das incorreções
na fala;(g) dos desajustes pessoais e sociais; e (h) da intervenção
nociva de profissionais não habilitados que na realidade causam seqüelas
tão ou mais contundentes quanto o não tratamento (PETRELLI, 1994).
Com base na importância da relação mãe-bebê
para o desenvolvimento do mesmo, a orientação, por mais simples
que seja, deve ser realizada ainda no leito hospitalar, para que a mãe
conheça a deformidade de seu filho e suas limitações antes
da alta hospitalar, pois, o impacto da malformação para a mãe
é intenso e se esta não possui o respaldo da equipe de saúde
assistente, lidar com o bebê e com os cuidados básicos que garantam
sua qualidade de vida do mesmo estarão comprometidos.
Perante o exposto, o presente estudo teve como objetivo verificar as orientações
recebidas nos hospitais por mães de bebês com DCF e as dificuldades
encontradas pelas mesmas nos cuidados com o bebê.
2 - MATERIAIS E MÉTODOS
O presente trabalho foi realizado
no Centro Pró-Sorriso do Município de Alfenas – MG. Trata-se
de uma unidade de atendimento a portadores de deformidades crânio-faciais,
sendo conveniado ao Hospital de Reabilitação de Anomalias Crânio-Faciais,
Bauru, SP. O Centro Pró-sorriso busca o diagnóstico e tratamento
de tais deformidades, sendo estes realizados por uma equipe de atendimento interdisciplinar,
envolvendo os profissionais da Fonoaudiologia, Odontologia, Medicina, Nutrição,
Enfermagem, Psicologia, Fisioterapia e outros.
Durante o ano letivo de 2005, acadêmicos das Faculdades de Enfermagem
coletaram dados, através da aplicação anamnese direciona,
obtendo informações referentes ao desenvolvimento, alimentação
e orientações que mães receberão ainda hospital
no período pós-natal referente ao cuidar de seus bebês portadores
de deformidades. Os dados foram coletados em um consultório do Centro
Pró-sorriso onde as mães eram convidadas a participar da pesquisa.
A amostra foi formada por mães crianças de 0 a 36 meses de idade
fissurados, independente da raça, classe social, sexo, região
de origem ou tipo de fissura, atendidas atualmente no Centro Pró-Sorriso
da Unifenas, cujos nascimentos ocorreram em cidades sul mineiras próximas
ao município de Alfenas.
3 - RESULTADOS
Durante o estudo 100 mães
de portadores de deformidades crânio-faciais foram abordadas pelos pesquisadores,
seus filhos apresentaram idade que variou de 1 a 36 meses, sendo 46 (46%) do
sexo masculino e 64 (64%) do sexo feminino.
Entre as crianças 15 (15%) apresentavam fissura transforame unilateral,
28 (28%) fissura transforame bilateral, 29 (29%) fissura pré-forame,
23 (23%) fissura pós-forame e 5 (5%) fissura rara de face. Com relação
à realização de cirurgia plástica corretiva 49 (49%)
dos fissurados já realizam pelo menos uma correção, os
demais ainda necessitam de mais cirurgias ou não atingiram os critérios
essências para o procedimento.
Quando questionadas as mães sobre a alimentação natural,
35 (35%) relataram ter amamentado seus bebês e 64 (64%) não amamentaram.
As mães que não amamentaram 42 (65.6%) alegaram não terem
recebido orientações profissionais que esclarecesse a forma correta
de lidar com a fissura e 15 (23.43%) afirmaram que mesmo com informações
tinham medo de amamentar e 7 (11%) justificaram que não tinham leite.
Para as 35 mães que amamentaram foi questionado o tempos que ofereceu
a mama, 16 (45,7%) até o sexto mês de vida do bebê, 9 (25.7%)
até o terceiro mês, 6 (17.14)% até um ano de idade e 4 (11.42%)
amamentou até 2 anos.
Dificuldades na amamentação foram relatadas pelas mães,
a tabela 01 demonstra os problemas comumente encontrados pelas mães no
aleitamento.
Tabela 01 – Referente às dificuldades encontradas pelas mães durante o ato de amamentar naturalmente o bebê.
Dificuldades |
Número
de mães |
O bebê apresentava regurgitação nasal | 72
(72%) |
O bebê apresentava engasgos e tosse | 56
(56%) |
O bebê apresentava perda do fôlego | 23
(23%) |
O bebê não sugava na maioria das mamadas | 15
(%) |
Questionou-se
que posição a mãe colocava o bebê para alimentação,
48% das mães referiram colocar o bebê mais verticalizado, 29% na
posição horizontalizada e 23% variavam a posição
do bebê. 73 mães não conheciam a relação entre
a postura e a incidência de otites.
Quanto a alimentação artificial do bebês (mamadeiras, chuquinhas
e outros), todas as crianças fizeram uso de mamadeira sendo esta associada
a amamentação natural ou não, 76% utilizaram mamadeira
desde o nascimento, 13% começaram a fazer uso no terceiro mês de
vida, 11% dos pacientes começaram a fazer uso com um ano.
As mães ou responsáveis foram questionadas se receberam orientações
sobre os cuidados com o bebê e esclarecimentos relacionados à malformação
antes da alta hospitalar. Questionou-se também qual profissional havia
orientado. A Figura 01 demonstra o resultado correspondente a este item.
Figura 01 – Numero de mães que foram orientada e mães que não receberam orientações referentes aos cuidados com os bebês portadores de deformidades crânio-faciais antes da alta hospitalar.
Segundo as 53 (53%) mães orientadas, apenas 28 (52.8%) foram encaminhadas ou informadas sobre centros especializados no tratamento de deformidades crânio-faciais, 15 (28.3%) buscaram tratamentos especializados, pois já conheciam pessoas com malformações e 06 (11.32%) tomaram conhecimento e buscaram auxilio a partir de informações fornecidas pela secretaria de saúde local e 04 (7,54%) através da internet.
4 – DISCUSSÃO
A amamentação é
a maneira natural de alimentar o bebê nos primeiros meses de vida, apresentando
muitas vantagens tanto para ele como para a mãe. A primeira delas é
que cada leite materno tem uma composição de nutrientes específica,
que acompanha as necessidades da criança durante seu crescimento. Além
disso, o leite materno contêm agentes imunológicos, doados pela
mãe, que protegem a criança de doenças infecciosas e diarréias.
Para completar, a amamentação fortalece a musculatura da face
e da boca do recém-nascido, o que previne futuros problemas na fala e
na oclusão dos dentes (CTENAS, E VITOLO, 1999). Os dados obtidos demonstra
um numero maior de portadores de fissuras palatais que compromete as funções
estomatognáticas, destacando a sucção e que deixa claro
a dificuldade de muitos bebês serem amamentados.
Um número pequeno de bebes foram amamentados conforme observamos nos
resultados de nosso estudo. O primeiro contato mãe-filho é através
da amamentação, pois o amor e o alimento são associados
na mente do bebê com a pessoa que o amamenta ou serve. Receber alimento
da pessoa amada é para a criança receber afeto. O alimento torna-se
símbolo de amor e felicidade, mas pode também representar ansiedade,
depressão etc (Macedo et al., 2002).
De acordo com Viuniski (2002), o leite materno é o alimento ideal para
o bebê, desde os primeiros momentos de vida e quando usado exclusivamente
até os 4 ou 6 meses, é suficiente para oferecer todos os nutrientes
e água que essa criança vai necessitar. Embora pouco bebes pertencentes
à amostra amamentaram, a mamadeira e chuquinhas segundo relato das mães
foram oferecidas com o leite materno não privando totalmente a criança
de seus benefícios.
A postura de alimentação deverá ser totalmente vertical,
para impedir o refluxo nasal, aspiração bronco pulmonar e otites
médias que são comuns nos indivíduos com fissura palatina
(Campiotto, 1997). Mesmo grande parte das mães entrevistadas alegarem
utilizar a postura verticalizada para alimentar os bebes muitas não conheciam
a importância de manter esta postura.
O ideal é o aleitamento materno, mas diante da dificuldade da criança
na alimentação ou da mãe em lidar com a situação,
freqüentemente é adotada a mamadeira, ou a associação
de mamadeira e aleitamento (Marques e Martinelli, 1992). Este recurso foi utilizado
por todas as mães em nosso estudo, demonstrando o empenho das mesma em
buscar formas de alimentar seus filhos.
Os bebês com fissuras palatinas podem engolir normalmente uma vez que
o alimento alcance a hipofaringe, mas têm extrema dificuldade para produzir,
na boca, a pressão negativa necessária para poder sugar o peito
ou a mamadeira. Quando um bico é colocado na boca do bebê, ele
começa a sugá-lo como qualquer outro recém-nascido, porque
os reflexos de sucção e deglutição são normais.
Entretanto, a musculatura não é desenvolvida, ou propriamente
orientada para permitir que a sucção seja eficaz. (Peterson et
al., 1996). Dificuldades na sucção, engasgos, regurgutacao nasal
e outras foram relatadas por varias mães, dificuldades estas justificadas
pelas limitações anatomo-funcionais nas estruturas orais do bebe.
Marques e Martinelli (1992), afirmam que a alimentação das crianças
portadoras de fissura lábio-palatal não pode ser esquecida ou
relegada a plano secundário pois, trata-se de uma das queixas mais freqüentes
durante as consultas pediátricas.
Tratando-se de um quadro delicado as deformidades crânio-faciais cabe
a equipe hospitalar orientar e tranqüilizar a mãe após a
descoberta da malformação. Orientações devem ser
oferecidas ainda em âmbito hospitalar propiciando segurança para
os cuidados mãe-filho. Pode-se verificar um papel restrito e pouco humanizado
da equipe nos diversos hospitais da região no que se refere ao nascimento
de bebes com tais deformidades.
A família, ao deparar com uma anomalia congênita que não
era esperada, sofre pela ansiedade e esta pode impedir que as informações
que lhes forem oferecidas possam ser armazenadas e aplicadas. A mãe teme
realizar procedimentos simples como amamentar o bebê, pois não
aceita que muitos cuidados podem ser os mesmos que os de um neonato sem malformação.
Desta forma além da equipe de saúde estar apta a orientar, ela
também deve conhecer os aspectos psicológicos da família
evitando assim o fato do cuidador negar que recebeu informações
e que quando estas forem realizadas, o profissional da saúde (enfermeiro,
fonoaudiólogo, fisioterapeuta, medico, nutricionista ou outros) saiba
manejar como transmitir as orientações à mãe, pois
ela garantirá o cuidado adequado fora da unidade hospitalar.
Não cabe apenas aos centros especializados em tratamento e reabilitação
de deformidades crânio-faciais a função de orientar, prevenir
e reabilitar bebês fissurados, pois, estes centros são poucos e
se orientações básicas (como amamentar, utilizar ou não
mamadeira, postura adequada e aproximidade do cuidado deste bebê com o
bebê normal) já forem realizadas pelos profissionais que atuam
nos hospitais, os pacientes que buscam os centros especializados apresentariam
um quadro clínico estável e prognóstico melhor. É
importante destacar que muitas das crianças que chegam em nossa unidade
de tratamento, Centro Pró-sorriso Alfenas-MG estão com baixo peso,
quadros anêmicos e muitas vezes desnutridos, pois, as mães têm
medo de alimentá-los por falta de orientação.
5 – CONCLUSÃO
Conclui-se que muitas mães
recebem alta hospitalar, sem uma atenção especial e uma orientação
efetiva referente a forma de cuidar e amamentar aquele bebê, deixando
uma barreira ainda maior entre o bebê com deformidade e o bebê normal.
Verifica-se que temores e tabus criados em torno da primeira alimentação
dos bebês não são eliminados nas unidades hospitalares estudadas.
Observam-se falhas no setor materno-pediátrico dos hospitais, pois ficou
claro a falta de orientação materna, sendo que esta é peça
chave para o desenvolvimento com saúde do bebê, sendo amamentado,
nutrido, amado e ficando apto para as futuras correções anatômicas
cirúrgicas e terapêuticas funcionais.
Seria função do médico, do fonoaudiólogo, do nutricionista
ou da enfermagem a garantia da qualidade de vida do neonato malformado? Talvez
todos nós podemos ser fonte de apoio à família deste paciente,
dar o respaldo, por mais básico que seja a estas mães, mães
que esperaram por nove meses um bebê perfeito e recebem o impacto da malformação.
Definir de qual profissional é a culpa é quase que impossível,
pois não são todas os hospitais ou maternidades que contam com
uma equipe variada na assistência a saúde; porém, é
obrigação do profissional ser seja capaz de pensar criticamente,
de analisar os problemas e procurar soluções muitas vezes simples,
mas que garantam o conforto do paciente e sua família.
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